O ano passado começou promissor para o mercado editorial brasileiro. Depois de perder entre 30% e 40% de seu faturamento desde 2013, o setor indicava uma curva ascendente para 2020. Para completar o otimismo, os números consolidados de 2019 mostraram o primeiro crescimento de receita desse segmento em seis anos. A sensação era de “agora vai!”. Contudo, no meio do caminho tinha uma Covid-19, tinha uma Covid-19 no meio do caminho. Ninguém podia imaginar esse acontecimento para um mercado com vendas já tão fatigadas. De uma hora para outra, o céu ficou novamente carregado e uma grande e nova tempestade se vislumbrou. Com esse panorama sombrio, as situações críticas da Livraria Cultura e da Livraria Saraiva só tornavam as coisas ainda mais nebulosas.
Para alegria geral da nação (leia-se: livrarias, editoras e escritores), o cenário do mercado editorial mudou sensivelmente a partir de julho. As vendas do segundo semestre foram retomadas e o crescimento compensou as perdas do primeiro semestre de 2020 (que foram trágicas). Há quem aponte a possibilidade do faturamento do último ano terminar em um surpreendente crescimento em relação ao de 2019. Para muita gente, se 2020 ficar no mesmo patamar do ano anterior, os resultados já serão satisfatórios.
Fiz essa rápida retrospectiva do ano passado do setor para explicar o comportamento do leitor brasileiro, tema desse post da coluna Mercado Editorial. Em meio a um cenário tão adverso como foi o de 2020, o que você acha que o brasileiro leu, hein? A resposta é um tanto óbvia: autoajuda, autoajuda e autoajuda. Se pensarmos bem, não mudou (quase) nada nos hábitos de leitura no Brasil com a chegada da pandemia. Afinal, nas duas últimas décadas, essa tem sido a pedida corriqueira dos compradores de livros em nosso país.
Nas quatro primeiras posições do ranking dos livros mais vendidos no Brasil em 2020, só temos títulos de autoajuda: (1º lugar) “Mais Esperto que o Diabo” (Citadel), de Napoleon Hill, (2º) “A Sutil Arte de Ligar o Foda-se” (Intrínseca), de Mark Manson, (3º) “Do Mil ao Milhão” (HarperCollins), de Thiago Nigro, e (4º) “O Milagre da Manhã” (BestSeller), de Hal Elrod. Alguém pode me questionar: “Mas o livro do Thiago Nigro não é autoajuda. Esta publicação é na verdade uma obra de negócios!”. Respeito quem enxergue dessa maneira. Porém, para mim, este livro é uma autoajuda para os investidores nacionais.
Então quer dizer que o brasileiro não está lendo ficção? Ele está, mas é pouco, muito pouco. Apenas dois títulos ficcionais aparecem na lista dos dez livros mais vendidos no país no ano passado. E, o que é mais assustador, a literatura consumida é normalmente estrangeira e voltada para o público infantojuvenil. Por isso, a supremacia da série “Harry Potter” (Rocco), de J. K. Rowling, e da série “Crepúsculo” (Intrínseca), de Stephenie Meyer. Isso indica que os jovens brasileiros estão lendo muito? Não! A conclusão que chego é que, de maneira geral, o gosto literário dos brasileiros adultos é muito parecido ou é igual ao das crianças e dos adolescentes (em um processo de infantilização da nossa sociedade). Esse é o retrato do nosso país atual! Ao menos em 2020, não tivemos obras religiosas nem títulos produzidos por celebridades da Internet (vou fingir que Thiago Nigro não é um influenciador digital, tá?) invadindo o topo da lista dos mais vendidos.
Ficou curioso(a) para conhecer os best-sellers das livrarias brasileiras no ano passado? Então, vamos ao que interessa: a lista com o top ten dos mais comercializados. Os dados que utilizamos no Bonas Histórias para indicar a listagem dos mais vendidos são obtidos do PublishNews, a fonte mais confiável do mercado editorial nacional. O PublishNews faz a medição do setor usando principalmente as informações coletadas nas principais redes de livrarias do país.
Veja, a seguir, o ranking dos 10 livros mais vendidos em 2020 no Brasil:
1) “Mais Esperto que o Diabo” (1938) – Napoleon Hill (Estados Unidos) – Autoajuda – Citadel – 113 mil unidades.
2) “A Sutil Arte de Ligar o Foda-se” (2016) – Mark Manson (Estados Unidos) – Autoajuda – Intrínseca – 104 mil unidades.
3) “Do Mil ao Milhão” (2018) – Thiago Nigro (Brasil) – Negócios – HarperCollins – 77 mil unidades.
4) “O Milagre da Manhã” (2012) – Hal Elrod (Estados Unidos) – Autoajuda – BestSeller – 62 mil unidades.
5) “Box com os 7 Livros da Série Harry Potter” (1997/2007) – J. K. Rowling (Inglaterra) – Ficção Infantojuvenil – Rocco – 55 mil unidades.
6) “Decida Vencer” (2020) – Eduardo Volpato (Brasil) – Autoajuda – Gente – 48 mil unidades.
7) “O Poder da Autorresponsabilidade” (2018) – Paulo Vieira (Brasil) – Autoajuda – Gente – 47 mil unidades.
8) “Seja Foda” (2017) – Caio Carneiro (Brasil) – Autoajuda – Buzz – 46 mil unidades.
9) “Sol da Meia-noite” (2020) – Stephenie Meyer (Estados Unidos) – Ficção Infantojuvenil – Intrínseca – 44 mil unidades.
10) “Os Segredos da Mente Milionária” (2005) – T. Harv Eker (Canadá) – Autoajuda – Sextante - 44 mil unidades.
Como as obras ficcionais são rotineiramente encobertas pela avalanche de títulos de autoajuda, vou fazer, em março, um post com o ranking dos livros de ficção mais vendidos no Brasil em 2020. Assim, iremos visualizar melhor os hábitos e as preferências dos leitores nacionais quando o assunto é literatura. Aguarde as novidades dos próximos meses da coluna Mercado Editorial do Bonas Histórias. Até lá!
Gostou deste post e do conteúdo do Blog Bonas Histórias? Se você se interessa por informações do mercado editorial, deixe aqui seu comentário. Para acessar outras notícias dessa área, clique em Mercado Editorial. E aproveite para nos acompanhar nas redes sociais – Facebook, Instagram, Twitter e LinkedIn.