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Bonas Histórias

O Bonas Histórias é o blog de literatura, cultura, arte e entretenimento criado por Ricardo Bonacorci em 2014. Com um conteúdo multicultural (literatura, cinema, música, dança, teatro, exposição, pintura e gastronomia), o Blog Bonas Histórias analisa as boas histórias contadas no Brasil e no mundo.

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Ricardo Bonacorci

Nascido na cidade de São Paulo, Ricardo Bonacorci tem 43 anos, mora em Buenos Aires e trabalha como publicitário, produtor de conteúdo, crítico literário e cultural, editor, escritor e pesquisador acadêmico. Ricardo é especialista em Administração de Empresas, pós-graduado em Gestão da Inovação, bacharel em Comunicação Social, licenciando em Letras-Português e pós-graduando em Formação de Escritores.  

Foto do escritorRicardo Bonacorci

Exposições: Monet à Beira d'Água - A mostra interativa do precursor do Impressionismo

Em cartaz no Parque Villa-Lobos até o final de março, o evento multimídia desenvolvido pelo Museu Itinerante de Artes Imersivas (MIRA) permite o mergulho sinestésico no trabalho de Claude Monet.

Monet à Beira d´Água é a exposição interativa realizada no Parque Villa-Lobos pela MIRA. A mostra imersiva é sobre Claude Monet, pintor francês que foi precursor do Impressionismo.

Entre um bloquinho e outro do Carnaval de 2023, a turma achou interessante visitar a exposição “Monet à Beira d´Água”, em cartaz desde 1º de novembro de 2022 no Parque Villa-Lobos. Nada como uma lufada de arte e um tempero de pintura clássica em meio à folia pelas ruas de São Paulo (que vitimou meu agora falecido e até então estimado e cheirosinho tênis), né? E nada como ter amigos com gostos tão ecléticos, hein? Empolgado com a proposta cultural durante a festa pagã (como vocês sabem, sou mais as visitas aos cinemas, às livrarias, aos museus e aos espaços artísticos do que os cortejos musicais atrás dos trios elétricos) e vislumbrando uma boa pauta para o Bonas Histórias (algo sempre bem-vindo), não pensei duas vezes e fui com o grupo de animados foliões conferir a mostra interativa de Claude Monet em pleno Sabadão de Carnaval.


Confesso que estava há um tempão querendo ver “Monet à Beira d´Água”. Cheguei até a rondar o local em janeiro, em minhas férias no trabalho da Dança & Expressão, tamanha era a minha disposição para conhecer a intitulada maior exposição multimídia do pintor francês que fora o precursor do Impressionismo. Na certa, calculei no auge do Verão paulistano, a visita renderia um ótimo post para a coluna Exposições, inativa desde abril de 2022, quando analisei a mostra fotográfica “Amazônia”, de Sebastião Salgado. Contudo, não sei o porquê, acabei não entrando naquele momento no novíssimo espaço artístico da cidade e na mostra digital de Monet. Talvez tenha sido seduzido, no mês retrasado, pela novidade da Roda Gigante ali perto (que também vale a visita!), pela continuação da caminhada pelo Parque Villa-Lobos (o meu favorito na capital paulista) ou mesmo por mais uma visita à Biblioteca do Parque Villa-Lobos (um local de parada obrigatória para quem curte literatura). Vai saber!


Dessa vez o lance foi totalmente diferente. Ao lado de quase uma dezena de amigos (dinâmica social em que nossas vontades pessoais são provisoriamente suprimidas pelas decisões do grupo), tendo comprado os ingressos antecipadamente (presente da Marcelinha – obrigado!!!) e querendo uma folga dos bloquinhos (assassinos da dignidade humana, do bom gosto musical e dos pares de tênis que não são à prova de água), era impossível declinar em cima da hora pela segunda vez a visita à “Monet à Beira d´Água”. Ainda bem! Porque curti pra valer o programa e a programação do evento, um dos mais inusitados em cartaz na cidade entre o final de 2022 e o início de 2023. É verdade que a boa companhia (abraços, Paulo, Mara, Rose, Caio, Marcela, Daniela e Markus!) também contribuiu para potencializar a experiência imersiva.


A exposição chegou a São Paulo depois de ter feito muito sucesso no Rio de Janeiro, onde bateu recorde de público. A tenda montada perto do Boulevard Olímpico, ao lado do belíssimo Museu do Amanhã, exibiu a mostra interativa sobre Claude Monet para os cariocas entre março e junho de 2022. Desenvolvido pelo Museu Itinerante de Artes Imersivas (MIRA), startup brasileira voltada para eventos artísticos com pegada multimídia e tom imersivo, “Monet à Beira d´Água” tem como proposta mostrar a relação do pintor francês com a água. Daí o nome do evento, claro! Vale a pena dizer que Claude Monet revolucionou a arte pictórica justamente pela técnica de pincelar traços que se aproximassem da realidade (daí o termo “passar a impressão”, que virou, obviamente, Impressionismo), mas sem a preocupação de emular a vida real tão fielmente (como era feito, por exemplo, pelos artistas do Realismo).

Realizada no Parque Villa-Lobos em São Paulo, Monet à Beira d´Água é a exposição interativa que permite a imersão no trabalho de Claude Monet

Para os pintores impressionistas (além de Monet, Pierre-Auguste Renoir, Édouard Manet, Edgar Degas, Berthe Morisot, Joaquín Sorolla, Olga Boznańska, Mary Cassatt e Max Liebermann foram figuras emblemáticas), uma tela deve sempre se parecer uma tela, mas também precisa transmitir a imagem da paisagem retratada, o que gera um efeito dúbio na plateia (realidade versus irrealidade). O ideal para eles é transmitir uma determinada imagem com o mínimo de pinceladas. Já para os pintores realistas (como Gustave Courbet, Édouard Manet, Jean-François Millet, Edgar Degas, Honoré Daumier, Rosa Bonheur, Winslow Homer e Isabel Quintanilla), um quadro tem que dialogar exclusivamente com os cenários, as pessoas e os objetos enfocados. Para eles, o público diante da pintura precisa se esquecer que está vendo uma recriação artística (efeito parecido com o que a fotografia faz), independentemente da quantidade de pinceladas. Aí o que vale é a aproximação ao máximo da realidade objetiva. Quanto mais fidedigno, melhor!


É importante dizer que o Impressionismo surgiu como oposição ao Realismo, que congregava as convenções da pintura acadêmica e oficial daquela época. Exatamente por isso, o novo estilo sofreu tanto preconceito do mercado das artes em meados do século XIX. A proposta impressionista estava ligada à pintura ao ar livre (en plein air). Os pintores queriam captar as mudanças dos efeitos luminosos sobre a paisagem. Para tal, eles utilizavam pinceladas largas e velozes, feitas com pequenos toques separados e que visavam reproduzir os efeitos das cores e das luzes no cenário recriado. Ou seja, no Impressionismo, a pintura era mais abstrata (do que no Realismo), com linhas sintéticas e rápidas.


As telas de Oscar-Claude Monet ganham mais força dramática quando têm como temática as paisagens (tanto os cenários naturais e rurais quanto os cenários artificiais e urbanos) e quando retratam diretamente a natureza nua e crua, principalmente o reflexo da água (rios, mares, praias, lagoas e lagos), o céu (nuvens, pôr do sol e nascer do sol), a vegetação (flores, plantas e árvores) e as montanhas (curvas sutis no horizonte). Não por acaso, suas criações mais famosas são: “Impressão, Nascer do Sol” (1872), “Ponte sobre uma Lagoa de Lírios d´Água” (1899), “Mulher com Sombrinha” (1875), “Lírios d'Água” (1919), “Catedral de Rouen” (1894), “Campo de Papoulas Perto de Argenteuil” (1875), “A Lagoa das Ninfeias, Harmonia Verde” (1899), “Ensaio de Figuras ao Ar-livre” (1886), “À Beira D´Água, Bennecourt (1868) e “Meules” (1890). Aposto que pelo menos uma ou duas pinturas dessa relação você conhece, certo?


“Monet à Beira d´Água” é uma mostra quase 100% digital (contudo, todos os direitos de exibição das imagens foram adquiridos pelos organizadores e produtores do evento). Os únicos elementos físicos são os objetos e os móveis que emulam a casa do pintor francês (mais à frente neste post da coluna Exposições, falarei com mais detalhes sobre isso). Dessa maneira, o público é impactado fundamentalmente pelo mix de luzes, imagens, cores e músicas que dialoga com o portfólio artístico e com a estética das pinturas de Claude Monet. A exposição traz 285 obras do artista impressionista que retratam paisagens como rios, lagos, mares, montanhas, moinhos, trens, neve, pessoas, flores, construções rurais e igrejas.

A exposição Monet à Beira d´Água está sendo realizada no Parque Villa-Lobos em São Paulo

O conteúdo de “Monet à Beira d´Água” está dividido basicamente em oito tipos de narrativa: (1) “Uma Viagem de Trem”; (2) “Campos e Moinhos”; (3) “O Mar e a Luz”; (4) “Horizonte Nevado”; (5) “Um Passeio pelo Lago”; (6) “Arquitetura do Tempo”; (7) “Paisagem en Vert”; e (8) “Flores de Tintas”. A partir das animações e das reproduções de imagens em 2D e 3D, o visitante da mostra pode acompanhar uma releitura (ou seria uma interpretação contemporânea e libertária, hein?!) do legado impressionista do artista francês. Portanto, não espere uma experiência didática e/ou convencional. A ordem aqui é a imersão sinestésica e interpretativa.


O diretor-executivo da exposição é Leo Rea Lé, um dos membros do MIRA (Museu Itinerante de Artes Imersivas). A criação de “Monet à Beira d´Água” exigiu o trabalho de aproximadamente 60 profissionais e demandou pouco mais de dois anos de produção. Entre as principais obras de Claude Monet contempladas na mostra, podemos citar as séries “Estação Saint-Lazare” (1877), “Catedral de Rouen” (1893), “Lago das Ninfas” (1895 a 1926), “Palacio de Westminster” (1904), “Grand Canal de Veneza” (1908) e “Ninfeias” (1906).


Curiosamente, por mais que tenha a temática aquática em seu nome, a exposição “Monet à Beira d´Água” não fica restrita a esse elemento do estilo e da proposta de trabalho de Claude. A pegada de fato da mostra é ser mais generalista do que específica. Gostei disso! Até porque algumas das pinturas mais famosas do artista não tratam objetivamente da água, como “Mulher com Sombrinha”, “Catedral de Rouen”, “Campo de Papoulas Perto de Argenteuil” e “Meules”. Seria um pecado excluir boa parte de seu portfólio só para encaixotarmos o espetáculo em uma determinada vertente temática, né? Ponto favorável para o bom senso dos organizadores e produtores do evento!


O segundo elemento positivo que preciso tratar com vocês sobre “Monet à Beira d´Água” é o espaço montado para o evento no Parque Villa-Lobos. A infraestrutura da exposição é invejável e não deixa nada a desejar a 95% dos museus nacionais e casas artísticas convencionais do nosso país. E olha que fui conservador no meu comentário. Poderia ter dito que o local da mostra está à altura da estrutura da maioria dos eventos internacionais do gênero. Porém, preferi a comparação doméstica. Não nos esqueçamos que vivemos em uma nação onde as praças artístico-culturais sofrem com o descaso e o abandono da esfera pública (é só ver a quantidade de locais que pegaram fogo nos últimos anos). Até pela necessidade de um lugar grande, confortável e 100% personalizado, a MIRA optou pela construção de um espaço próprio e acho que provisório (que de provisório não tem nenhuma aparência!) tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro.

Em cartaz em São Paulo, a exposição Monet à Beira d´Água é uma criação do Museu Itinerante de Artes Imersivas (MIRA)

“Monet à Beira d´Água” está sendo exibido em uma tenda com cerca de 4 mil metros quadrados. Se você já acha o Parque Villa-Lobos bonito, amplo e agradável (apesar da falta crônica de árvores), você precisa conhecer então a infraestrutura da mostra interativa de Claude Monet. Antes de falarmos da exposição em si, preciso destacar o espaço de apoio aos visitantes. O público tem à disposição um bistrô (pode chamá-lo de lanchonete ou café que dá no mesmo), em uma espécie de praça de alimentação anexa ao museu. Além de ser lindo, o espaço de comes e bebes é grande, confortável e possui uma estética visual que dialoga diretamente com o país do artista retratado. O que a gente mais ouve ali são frases como: “nossa, que lugar bonito!”; “que espaço mais gostoso!”; e “pessoal, venham ver que fofinha é a praça de alimentação da exposição”.


O mais legal é que o cuidado com a experiência do visitante não para por aí. Ainda temos uma lojinha com um bom acervo (só não olhe os preços, tá?), espaços específicos para fotos (tanto pagas quanto gratuitas), banheiros bem cuidados, bilheteria de bom porte, lugares para informações aos visitantes, local de espera-descanso e um belo deck de madeira para acesso/trânsito de pessoas. Alguém aí pode até alegar: mas isso tudo é uma estrutura mínima que esperamos de um museu, Ricardo. É verdade, querido(a) e exigente leitor(a) do Bonas Histórias. Eu sei disso e concordo em gênero, número e grau com você. Mesmo assim, eu confesso que fico positivamente impressionado quando recebo uma avalanche do que vejo como agrados e mimos, mas que deveriam ser requisitos básicos de qualquer praça artística e cultural.


Logo na entrada de “Monet à Beira d´Água”, o público é recebido por um conjunto de andaimes que revestem a tenda branca que encobre o local. No alto das estruturas metálicas, a logomarca do evento fica quase que escondida, oculta de certa maneira dos olhares mais furtivos e despreocupados. Para acessarem o local da exposição, depois de passarem pela bilheteria e pelo hall de entrada, os visitantes atravessam uma ponte emoldurada por um belo cenário de luzes e formas geométricas. Não à toa, há uma equipe de fotógrafos profissionais tirando fotos de quem passa por ali (as fotos serão vendidas por R$ 100,00 cada uma na saída da mostra).


Dentro do espaço principal de “Monet à Beira d´Água”, no caso a parte do museu onde rola a exposição pra valer, temos salas que estimulam a experiência multissensorial do visitante. Nos primeiros cômodos, em uma espécie de conjuntos de túneis temporais, acompanhamos quadros digitais que brincam com a ilusão de ótica e as perspectivas em 3D. Na sequência, a plateia é levada para mais simulações dos principais quadros de Claude Monet e encara uma rápida retrospectiva textual da carreira do artista francês. Nesse momento, há diferentes tipos de atividades e interações. Uma das mais populares é aquela que permite ao visitante fingir que está pincelando os quadros de Monet. É algo simples e meio pueril, mas funciona. A galera parece curtir bastante.

Monet à Beira d´Água é a mostra multimídia sobre Claude Monet, pintor francês precursor do Impressionismo

Outro espaço disputado é a réplica da casa de Giverny, na região da Normandia, em que o pintor viveu e usou como cenário de várias de suas pinturas. O cuidado com cada detalhe é algo que merece ser apreciado. Sei disso porque brinquei com uma das funcionárias do museu dizendo que duvidava que a residência de Monet em Giverny fosse realmente parecida com aquela que estava sendo exibida na exposição brasileira. Rapidamente, a moça sacou o aparelho celular do bolso e começou a me mostrar fotos da casa original, que existe até hoje no interior da França e que é um espaço cultural bastante popular (no caso, é a sede da Fundação Claude Monet). Além de mostrar o quão fidedigno era o espaço da mostra, a funcionária relatou várias particularidades muito interessantes sobre a vida e sobre a carreira de Claude Monet. Achei incrível o conhecimento, a simpatia e a didática da moça. Em questão de segundos, uma multidão já havia se formado ao nosso redor para ouvi-la.


Por falar na casa de Monet, note a grande quantidade de referências à cultura japonesa contidas ali. É incrível perceber que já no final do século XIX, Claude Monet já tinha ciência e, principalmente, apreciava muitos elementos estéticos da arte oriental. O pintor impressionista ficou fã da cultura japonesa, principalmente das xilogravuras de Hiroshige e Hokusai, quando morou na Holanda, que tinha um intenso intercâmbio cultural com a Ásia naquela época (muito maior do que a França tinha). Observe também o cuidado no qual o escritório (ou seria ateliê?) do artista francês foi montado. Nas paredes e nos cavaletes, conferimos de um jeito bem sutil algumas de suas pinturas mais famosas.


Ao lado da réplica da residência do pintor em Giverny, temos uma seção da exposição “Monet à Beira d´Água” que relaciona as obras do pintor impressionista às paisagens reais do Rio Sena. A mostra tem a preocupação de apontar ponto a ponto os cenários do icônico rio francês no final do século XIX com as criações pictóricas de Claude Monet. Vale a pena conferir as correlações e o mapa.


A visita termina no cômodo maior e mais midiático. É nesse gigantesco espaço com telas enormes para todos os lados que o público assiste às projeções audiovisuais em 360 graus (nas paredes e no chão) que servem de mote para a exposição. Precisamos reconhecer que há ali bastante tecnologia embarcada (totalmente nacional, vale a pena frisar) e ótimos efeitos de multimídia (fruto da sensibilidade dos curadores que souberam unir as imagens das pinturas de Claude Monet com músicas contemporâneas que se casam perfeitamente com o estilo do francês). Nessa parte da mostra (se fosse um livro ou um filme, diria que chegamos ao clímax), a plateia de “Monet à Beira d´Água” acompanha dois vídeos chamados de Passeio 1 e Passeio 2. Há um rápido intervalo entre as sessões de cinema (ops, sessões de vídeo) e elas duram ao todo de 30 a 40 minutos, se eu não estiver enganado (acabei não cronometrando). Sem dúvida nenhuma, essa é a parte mais impactante do evento. Sabemos disso pela quantidade de flashes das câmeras fotográficas dos celulares e pelas poses das pessoas na hora de serem clicadas.

A exposição Monet à Beira d´Água está sendo realizada no Parque Villa-Lobos em São Paulo

Repare que nessa seção da exposição, temos vários elementos arquitetônicos e paisagísticos que dão um colorido especial às projeções. No centro da sala maior, há uma lua gigantesca, que confere um efeito quase que sobrenatural ao lugar e permite uma conexão íntima com a natureza. Adorei também a ponte sobre o lago, que é uma referência intertextual óbvia à tela mais famosa de Monet, e ao pequeno mirante que fica ao fundo do espaço, que emula a curiosidade do artista em contemplar a paisagem por todas as perspectivas.


É inegável que “Monet à Beira d´Água” seja uma exposição interativa com vários pontos positivos. Por isso, acredito que ele mereça sim ser visitado (mesmo no Carnaval). Para início de exaltação, é preciso dizer que a tecnologia empregada é realmente interessante e extremamente impactante (ainda mais quando sabemos que ela é inteiramente nacional). Os recursos tecnológicos acabam sendo ressaltados ainda mais com o cuidado e a sensibilidade dos artistas brasileiros responsáveis por fazer a releitura da estética do pintor impressionista. Ou seja, não temos aqui a tecnologia pela tecnologia (um equívoco comum em eventos digitais e em espetáculos interativos). Não! Ela foi empregada por uma finalidade artístico-cultural maior. Incrível, né?


A transformação dos quadros de Claude Monet em projeções audiovisuais que simulam uma sessão de cinema (no caso, o correto seria dizer “duas sessões cinematográficas consecutivas”) é uma ideia genial e, obviamente, rende os momentos de maior emoção da exposição. Além de ser bastante tocante, tal proposta apresenta um processo de reinterpretação artístico muito exitoso. Repare na harmonia entre músicas e imagens e na história contada através da sucessão de pinturas que aparecem na tela. É verdade que para apreciar esse efeito em “Monet à Beira d´Água”, o público precisa de atenção e concentração (dueto cada vez mais raro no século XXI, ainda mais em uma atividade interativa e pouco linear) e de algum repertório sobre o portfólio de Monet.


Em relação a esse último aspecto (o repertório da plateia), é legal dizer que a primeira parte da mostra serve justamente de preparação do público para a obtenção desse conhecimento. Ou você acha que se apresentou uma grande quantidade de trabalhos de Claude Monet por nenhuma razão, hein? Ninguém precisa chegar à última ala do espaço cultural sabendo tudo sobre o artista francês. Porém, é válida e indicada a imersão prévia. Quanto mais os visitantes explorarem as partes iniciais da exposição, mais preparados eles estarão para degustar o pot-pourri audiovisual ofertado na sala final.

Em cartaz em São Paulo, a exposição Monet à Beira d´Água é uma criação do Museu Itinerante de Artes Imersivas (MIRA)

O problema é a ansiedade do público. Ávidas para assistir à melhor parte do espetáculo, várias pessoas não se aguentam e passam de forma batida pelos cômodos informacionais. Aí é óbvio que faltarão subsídios para se aproveitar mais intensamente a experiência cinematográfica de “Monet à Beira d´Água”, né? Por isso, não tenham pressa para percorrer todas as salas da exposição, senhoras e senhores.


Falo sobre isso porque o grupo em que eu estava (desculpa, pessoal, mas preciso contar...) cometeu justamente tal equívoco. Eles correram na parte inicial e acabaram ficando um pouco frustrados com o resultado da mostra. Talvez a mania de pular atrás do trio elétrico nos últimos dias os tenha influenciado negativamente no processo de interagir com as obras artísticas em um museu. Ao constatar o vacilo, juro que pensei: mas é claro! Quem manda não degustar os pratos iniciais do banquete antes da sobremesa. Alguns dos meus amigos chegaram à sessão audiovisual sem ter atinado sobre a técnica, os principais quadros e o estilo de Claude Monet. Aí como eles poderiam compreender a releitura do trabalho do francês feita pela união de música e imagens em movimento, né?


É verdade que a curiosidade do público sobre o trabalho do pintor impressionista se torna maior depois de assistir às projeções do que no início da visitação. Exatamente por isso, acredito que a exposição poderia ter uma movimentação mais cíclica, algo que não é permitido. Em “Monet à Beira d´Água”, você não pode retornar às partes iniciais depois de ter conferido os Passeios 1 e 2 na sala de projeções – o único caminho permitido é a porta de saída. Como assim não podemos voltar às alas prévias?! Justamente agora que ficamos realmente curiosos para mergulhar de cabeça (no caso, com mais atenção e mais concentração) no portfólio de Claude Monet, somos impedidos. Ai, ai, ai. Não gostei disso.


Se fosse permitido o retorno às salas iniciais da exposição (algo facilmente viabilizado já que a estrutura da tenda é circular), creio que a plateia iria aproveitar mais e melhor as atividades lúdicas ali apresentadas. Até porque elas são ótimas. Elas fazem o público interagir com as obras de um jeito diferente, pouco usual em um museu. O problema, como disse, é a ansiedade do povo. Uma vez saciada a curiosidade desmedida pela sessão audiovisual, na certa os visitantes iriam curtir mais as partes do começo da mostra.


Em se tratando de infraestrutura, não tenho nenhum outro ponto para comentar (além da possibilidade de retorno às salas já visitadas) em “Monet à Beira d´Água”. Há muito tempo não ia a um local artístico-cultural tão bem montado e tão bem-preparado para receber o público. O MIRA está de parabéns! O trabalho da equipe do Museu Itinerante de Artes Imersivas foi tão bem-feito que mesmo que você não goste do Impressionismo, de Claude Monet, de arte, de cultura e da civilização humana (nesse caso, até sei em quem você votou nas últimas eleições!), na certa você ainda gostará da experiência da mostra.

Monet à Beira d´Água é a mostra multimídia sobre Claude Monet, pintor francês precursor do Impressionismo

Quando enalteço a infraestrutura, preciso destacar a preocupação dos organizadores com a questão da acessibilidade. Quase todas as partes da exposição possuem leitura em braile. Há também piso tátil e QR Code com áudio descrição para quem não tem visão. O espaço também é adaptado para cadeirantes, que podem transitar por quase todo o local (a exceção é o mirante na sala principal). Completa a estrutura impecável a presença de uma equipe numerosa, simpática e altamente treinada.


De aspectos negativos em “Monet à Beira d´Água”, achei o valor dos ingressos um pouco caro. Isso porque eu não paguei (lembram que foi presente?!). Imagine se eu tivesse pagado... Apesar da bilheteria dizer que as entradas começam em R$ 30,00, é bom saber que provavelmente você pagará de R$ 75,00 a R$ 85,00. Essa quantia é aproximadamente o que você pagará por pelo menos dois ingressos de cinema. É salgadinho, meus amigos. Até porque você gastará mais na visita (como não tomar café na praça de alimentação tão bonita e não levar uma lembrancinha da loja com tantas coisas legais).


Também achei que faltou um conforto maior na sala principal de projeções. O público acaba precisando se sentar no chão ou se encostar na parede para apreciar o audiovisual. Sim, você leu corretamente. A maioria das pessoas fica atirada ao léu. Se por um lado essa característica dá um ar de informalidade e descontração ao ambiente, por outro lado traz um enorme desconforto, algo inadmissível para o valor investido no ingresso.


Além de permitir o fluxo cíclico dos visitantes (como já comentei), “Monet à Beira d´Água” se tornaria uma experiência mais enriquecedora se tivesse um pouco mais de elementos didáticos e conceituais. A interatividade é muito legal e estimulante. Mesmo assim, acredito que não se deva abrir mão totalmente das informações sobre as pinturas, a escola artística e o pintor estudados. Jamais deve-se priorizar a forma em detrimento ao conteúdo. Até porque lá na frente, na hora de acompanhar o Passeio 1 e o Passeio 2 na sala de projeções, os visitantes precisarão de embasamento para curtir pra valer o audiovisual.


Outra questão que preciso comentar é o estacionamento. Quem não estiver acostumado a frequentar o Parque Villa-Lobos, saiba que você precisará achar o local da exposição dentro do complexo do parque após parar o carro. E o Villa-Lobos é gigantesco. Em outras palavras, você precisará andar bastante do estacionamento até a mostra. O bom é que há sinalizações por todos os lados indicando o caminho correto. Além disso, segundo reza a lenda, o público de “Monet à Beira d´Água” tem à disposição carrinhos elétricos para facilitar a jornada do estacionamento até o espaço da exposição. A questão é encontrá-los. Confesso que não vi nenhum na minha visita.

Monet à Beira d´Água é a exposição interativa que permite a imersão no trabalho de Claude Monet

Resolvi tratar aqui dessa questão da distância do estacionamento porque as sessões da mostra interativa de Claude Monet são à princípio com horário marcado. Então, não chegue tão em cima da hora nem atrasado ao estacionamento. Se fizer isso, você entrará na exposição com pelo menos meia hora além do horário marcado. Se bem que pelo que vi em “Monet à Beira d´Água”, não parece existir um controle tão rígido assim com relação ao horário do ingresso. É verdade que não chegamos atrasados para saber exatamente os problemas acarretados. Não sei se tivéssemos entrado além do prazo teríamos algum tipo de problema. De qualquer forma, é bom não se atrasar, né?


Por falar no Parque Villa-Lobos, achei que a experiência do público em São Paulo é totalmente diferente daquela obtida pelos visitantes da versão do evento no Rio de Janeiro, apesar de contemplarem o mesmo acervo. Na capital fluminense, a tenda montada no meio da cidade e ao lado do mar valorizava mais a estrutura esférica do teto e as paredes brancas do espaço. Da calçada com vista para o Boulevard Olímpico, era possível ver boa parte da construção. Por lá, também havia um contato maior com a água, grande mote da mostra (afinal, o mar estava ali do lado, sendo possível com algum esforço ouvir as ondas quebrando no antigo porto). Em São Paulo, perdeu-se a dinâmica arquitetônica do espaço (não é possível vê-lo na entrada) e desapareceu a relação concreta com a água (neste parque paulistano não há um lago, diferente por exemplo do Ibirapuera). Por outro lado, temos no Parque Villa-Lobos uma maior imersão com a natureza. E o espaço dedicado ao evento é pelo menos o dobro da edição carioca. Perde-se em alguns pontos, mas ganha-se em outros.


Terminada a visita à exposição, não é preciso dizer que meus amigos voltaram instantaneamente para o clima de Carnaval. Mal saíram de “Monet à Beira d´Água”, eles recomeçaram à busca incessante pelo bloquinho mais animado. É isso, senhoras e senhores. Em época de folia, a concorrência que os programas mais culturais têm chega a ser desleal. Fazer o quê? É esperar o retorno aos dias normais, quando as ruas da cidade voltam a pertencer exclusivamente aos endiabrados veículos. O que parece não mudar nunca é a atemporalidade e o impacto da arte de Claude Monet. Independentemente da forma e do meio de reprodução, a estética impressionista é, desculpe-me pelo inevitável trocadilho, impressionante!!!


A exposição “Monet à Beira d´Água” seguirá em cartaz na capital paulista até 26 de março de 2023 (não sei se ela irá para outra cidade brasileira na sequência). O palco da mostra é o Parque Villa-Lobos, localizado no bairro do Alto de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo. Quem gosta de esporte e arte, dá para unir os dois elementos em uma visita simultânea ao parque. As sessões de “Monet à Beira d´Água” acontecem basicamente de terça a domingo das 10h às 21h. A duração média do passeio gira em torno de uma hora, uma hora e meia. O acesso à exposição é para todas as idades (crianças de até cinco anos não pagam) e os ingressos (que custam de R$ 30,00 a R$ 85,00 por pessoa) podem ser adquiridos tanto na bilheteria física quanto na bilheteria virtual.


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