Depois de se consolidar como um dos principais espaços de análise literária e cultural da internet em língua portuguesa, o Bonas Histórias comemora nesta semana uma década de vida, o que o coloca como um dos blogs de arte e entretenimento mais longevos do Brasil.
Se eu fosse muito amigo dos clichês (somos apenas velhos conhecidos), poderia dizer que tenho a impressão de que foi ontem que essa história começou. Mas sendo beeeeem sincero com você, leitor assíduo ou ocasional da coluna Premiações & Celebrações, não parece, não! Pelo contrário. Foram tantas as águas que rolaram embaixo da ponte que os incansáveis ponteiros do meu relógio andaram devagar e não rapidamente. A sensação é que, entre altos e baixos, alegrias e tristezas, acertos e erros, conquistas e derrotas, sortes e azares e acasos e destinos, uma vida inteira se passou num pequeno intervalo de tempo. Pequeno intervalo de tempo? Tá bom! Não foi assim tão curto. Tal qual São Tomé, curvo-me às inevitáveis evidências que se escancaram diante da minha face incrédula.
Por falar em face, há exatamente 10 anos, encontrei por acaso com um rapazinho no reflexo do espelho de casa. Era uma manhã de Verão, mas o friozinho das montanhas do Sul de Minas trazia frescor para as boas almas e leveza para os corações puros. Naquela altura do campeonato, admito que meu amigo recém-chegado não era tão jovem quanto gostaria, por mais que ainda tivesse muitos cabelos (alguns com fios precocemente brancos), boa visão (para um míope de poucos graus) e uma magreza de dar dó (que levaria Dona Júlia ao desespero, se ela estivesse viva). Naquela oportunidade, o moço (leia essa palavra com sotaque mineiro, por favor) me encarou num mix de desespero e clemência. Contudo, o que mais me chamou a atenção em sua fisionomia foi o ar de sonhador e a aura de destemido.
Lembro que o sujeito no reflexo já procurava um dia a dia mais calmo e longe de sua caótica São Paulo. Também queria ganhar a vida como escritor e produtor de conteúdo. Creio que já estava cansado de trabalhar com Publicidade e Marketing. Captei tudo isso sem que precisássemos trocar uma só palavra. Ao entendê-lo em uma espécie de telepatia instantânea, juro que, com o típico preconceito das doutoras mais ambiciosas e gatinhas das margens do Rio da Prata, pensei: “Que tipo mais estranho! Ou está louco por escolher o caminho mais difícil para a longa caminhada ou é ingênuo ao ponto de achar que a trajetória esburacada não cobrará um preço amargo demais”. Como se tivesse se ofendido com minha reflexão, ele sumiu e nunca mais nos vimos.
Por que estou falando sobre isso neste post comemorativo do Bonas Histórias? Porque ontem de manhã, ao ir ao banheiro de meu apartamento em Buenos Aires para fazer a barba de vários dias (não podia ir à feirinha de domingo de Saavedra daquele jeito, né?), reencontrei o velho conhecido. Velho não é figura de linguagem nesse caso. Quase não o reconheci quando ele surgiu de supetão diante de mim outra vez na frente do espelho. O visitante estava grisalho, com óculos fundos e (desculpe-me falar) bem gordito. Porém, parecia feliz. Seus olhos verdes brilhavam e um sorriso despontou no rosto cada vez mais arredondado.
Quando cruzamos os olhares, imediatamente sentimos que ambos tinham razão em relação aos pensamentos do primeiro encontro. Tal qual uma partida de futebol que termina empatada para satisfação de ambas as equipes, constatamos a confluência de sentimentos de uma década atrás. Eu estava certíssimo por ter previsto o mar de dificuldades que o pobre (não há figura de linguagem no uso desse termo agora) enfrentaria. E ele não estava nem um pouco errado ao batalhar por suas vontades e paixões, por mais amalucadas que parecessem para mim (e para aqueles que o cercavam) na época.
Para quem não sabe, o Bonas Histórias surgiu em 1º de dezembro de 2014 como um blog de literatura, cultura e entretenimento. De um jeito amador e improvisado, o objetivo era dar vazão aos sonhos daquele paulistano tímido de 33 anos que iniciava o caminhar pelo mundo da Escrita Criativa e da análise ficcional. A ideia de seu criador era simplesmente se divertir com a arte textual e se desenvolver profissionalmente na nova área de atuação. Por isso, a procura pelas boas histórias nas mais diferentes manifestações artísticas – literatura, cinema, música, teatro, dança, exposição, gastronomia, passeio e programas de rádio, televisão e internet. Uma vez encontradas as tramas ficcionais inspiradoras, elas seriam compartilhadas, comentadas e analisadas com profundidade, independência e sinceridade.
E assim foi. A cada ano, os posts do Bonas Histórias se tornaram mais completos e bem escritos. Preciso dizer que, no início, os textos do rapazinho que por vezes me visita eram sofríveis. Além dos vários erros de português, o conteúdo era raso e as avaliações mostravam-se muito tacanhas. Se está duvidando de mim, querido(a) e desconfiado(a) leitor(a) deste blog, vá lá e leia os materiais antigos. Juro que fico com vergonha de quem os escreveu e de quem fazia o projeto gráfico do site. Tenho até mesmo receio de reler as análises dos primeiros anos. Tem cada coisa horrível por lá, Santo Deus!
Por outro lado, reconheço que meu amigo foi melhorando. Pouco a pouco, fui notando sua evolução. Sim, eu acompanho o blog desde o primeiro dia e li TUDO o que foi publicado até aqui. É claro que a prática leva naturalmente ao aprimoramento. Ainda assim, destaco que o visionário criador do Bonas Histórias precisou fazer outra graduação (Licenciatura em Letras), pós-graduação (Formação de Escritores) e vários cursos (Oficinas de Escrita Criativa, Roteiro de Cinema, História da Arte etc.) para se tornar um crítico cultural com o mínimo de qualificação. Acho que ele conseguiu ao menos atingir um patamar aceitável de excelência. Se não é alguém primoroso no novo (agora velho) ofício, pelo menos não passa mais tanta vergonha como outrora.
Paradoxalmente, ontem, no aniversário de 10 anos do Bonas Histórias, quem foi congratulado por colegas, amigos, leitores e patrocinadores fui eu, que não tenho nada a ver com o sucesso do blog. NADA! Já o moço que veio me visitar na Argentina e que atrapalhou meu barbear dominical, que é o verdadeiro responsável pela longevidade e qualidade do site, sequer foi lembrado. NINGUÉM o mencionou. Juro que fiquei perplexo com tanta injustiça. Como o povo que entrou em contato comigo não entenderia minha postura reticente, preferi não comentar a transferência dos parabéns para seu verdadeiro merecedor. Simplesmente aceitei os cumprimentos e me calei em relação ao enorme equívoco coletivo.
Esse texto é para colocar as coisas em seu devido lugar (meu pai falaria colocar os pontos nos is). Agradeço de coração as lembranças e as felicitações recebidas ontem. Aqui vai formalmente o meu muito obrigado a todos! Inclusive, as equipes da Epifania Comunicação Integrada e da EV Publicações, parceiros do blog desde os tempos da Pedra Lascada, pousaram há poucas horas no Aeroparque. Eles vão, entre outros eventos etílico-gastronômicos, participar dos festejos do décimo aniversário do Bonas Histórias. É isso mesmo o que você leu: ao longo dessa semana inteira, acontecerão eventos comemorativos do blog em Mi Buenos Aires Querido. Impossível não nos sentirmos importantes e internacionais, né? Só faltou mesmo o pessoal da Dança & Expressão para que as celebrações ficassem completas. Contudo, receberemos a visita da turminha mais dançante de São Paulo no final deste mês, quando a academia de Perdizes entra em férias coletivas (e seus dançarinos correm em direção ao primeiro aeroporto disponível).
Mesmo grato pelos cumprimentos, gostaria de direcioná-los ao verdadeiro responsável pela construção e manutenção do Bonas Histórias. Sou tão displicente que nem sequer sei o nome daquele rapaz misterioso (e, convenhamos, bem esquisito também – Angelina diria “desregulado”, Gaby falaria “tri cancheiro” e Marcelinha soltaria “pangaré”). Foi ele quem deu o pontapé inicial do blog e o alimentou por vários e vários anos, mesmo sem remuneração e sem qualquer perspectiva de êxito. Até hoje não sei como ele conseguiu e o que teve de abrir mão.
Por mais que insista em viver nas sombras (seria vergonha?), saiba, meu amigo tímido e obscuro, que sou muito grato por suas decisões de lá de trás. Se represento o Bonas Histórias atualmente e se estou à frente das principais ações da empresa no dia a dia, reconheço que peguei o bonde andando. Alguém teve o trabalho de desenvolvê-lo e colocá-lo nos trilhos. Ou seja, a maior parte dos méritos (pelo menos no meu humilde ponto de vista) desta saga que já conta com uma década de existência é seu, amiguinho reflexivo.
Por isso, o meu muito obrigado a você. De coração! E desculpe-me se, em algum momento do passado cada vez mais remoto, eu questionei seus passos, não acreditei em suas decisões e não validei suas vontades mais íntimas. Se havia alguém que jamais poderia ter duvidado de você e que nunca poderia tê-lo abandonado, esse alguém era eu. Porém, como sou falho (muito, para ser franco) e descrente (talvez essa palavra me defina melhor do que qualquer outra), eu vacilei. Vacilei MUITO com você. Perdão! Estou tão arrependido que venho à público reconhecer meus antigos erros e expressar meus agradecimentos e admirações por sua pessoa.
Valeu! Que possamos nos encontrar mais vezes, de preferência em vários outros aniversários do Bonas Histórias.
Que tal este post e o conteúdo do Bonas Histórias? Seja o(a) primeiro(a) a deixar um comentário aqui. Para acessar os demais posts desta coluna, clique em Premiações e Celebrações. E aproveite para acompanhar o Bonas Histórias nas redes sociais – Facebook, Instagram, Twitter e LinkedIn.