Em 2019, a coluna Contos & Crônicas do Bonas Histórias chega à sua quinta temporada. A proposta para este ano é darmos alcance às vozes entrecortadas da cidade de São Paulo. De certa maneira, o escritor sai um pouco de cena e quem ganha o protagonismo artístico é a massa anônima que transita diariamente pela maior metrópole do país. Serão os rostos desconhecidos dos habitantes da capital paulista os responsáveis por produzir a coletânea de contos de “Diálogos Urbanos”, a nova série narrativa que irei apresentar periodicamente neste blog.
A ideia de “Diálogos Urbanos” nasceu depois que li algumas obras da chamada Escrita Não Criativa. Para ser sincero, não fiquei totalmente fã deste tipo de técnica literária em um primeiro momento. A maioria dos livros de Kenneth Goldsmith me pareceram vazios, sem qualquer atrativo. “Day” (Edição no Brasil), de 2003, e “Traffic” (Também sem edição em português), de 2007, são publicações que dão ao leitor a vontade de atirá-las pela janela de casa antes mesmo de se concluir suas leituras. Por outro lado, acabei conhecendo algumas derivações da técnica da escrita do norte-americano que me agradaram muito mais. “Sessão” (LunaPARQUE), do carioca Roy David Frankel, e “Trânsito” (LunaPARQUE), versão nacional de Leonardo Gandolfi e de Marília Garcia de “Traffic”, são bastante interessantes e obtiveram um resultado narrativo e estético muito melhor.
Tendo essas obras como inspirações (positivas e negativas), resolvi utilizar em “Diálogos Urbanos” várias das técnicas literárias da Escrita Não Criativa: citação (ao estilo de Eliot e dos poetas modernistas brasileiros, Bandeira e Drummond, por exemplo), writing through (de John Cage a Pablo Katchadjian), restrição (como a feita por Georges Perec) e cut-up (de Tristan Tzara a Brion Gaisin e William S. Burroughs). Admito que a proposta é ousada e possui um aspecto de experimentalismo que me preocupa. Sinceramente, não sei onde isso vai dar. O resultado pode ser satisfatório. Contudo, também pode não ser.
Explicarei de forma geral como serão desenvolvidos os contos de “Diálogos Urbanos”. Em um primeiro momento, sairei pela cidade capturando os sons urbanos em um gravador portátil. Andarei pelas avenidas movimentadas das áreas centrais e pelas ruas tranquilas dos bairros periféricos. Pegarei os ônibus municipais e os trens da CPTM e do Metrô. Além disso, estarei atento às conversas nas mesas dos restaurantes, nas bancadas das padarias e nas praças da cidade. As palavras ditas nos elevadores, nas filas do supermercado e nas reuniões empresariais estarão no meu radar. Os pronunciamentos dos políticos, as transmissões das rádios, os programas de televisão, as mensagens e os vídeos virais da Internet, os bate-papos no bar, as trocas de confidências entre casais de namorados na calçada, os alertas do sistema de som do aeroporto, os telefonemas aos call centers, a pregação do pastor no culto, a explicação da professora em sala de aula... Cada conversa, cada barulhinho, cada mensagem e cada som produzidos em São Paulo poderão ser alvo do trabalho incansável do meu gravador. Por questões éticas, o que for registrado deverá se manter no anonimato, preservando a identidade e os aspectos pessoais dos envolvidos.
Depois de registrar esse material em arquivos de som, começará a segunda parte da empreitada: a transcrição. Passarei tudo o que estiver nas palavras faladas do gravador para as palavras lidas/escritas do Word do meu notebook. Assim, tentarei passar a diversidade, a complexidade e a polifonia da cidade de São Paulo para o registro textual.
Por fim, a terceira e última fase do processo de construção das narrativas será selecionar os trechos mais interessantes de todo o material coletado. Para tal, poderei fazer combinações de textos diferentes e usar a imaginação para mesclar ficção e não ficção. O ideal é que cada conto de “Diálogos Urbanos” tenha elementos verossímeis ou próximos da realidade, mas que sejam comoventes e emocionantes para o leitor.
Não falei que a proposta era ousada e diferente? O resultado é imprevisível. De março a dezembro, vou postar, em média, um conto de “Diálogos Urbanos” a cada dois meses no Bonas Histórias. Ou seja, até o final do ano esta série narrativa terá mais ou menos cinco histórias. Não há um tema central. O único elemento que todas essas histórias produzidas deverão ter em comum é o diálogo com a realidade urbana da cidade de São Paulo. Suas personagens, seus conflitos e seus dramas deverão girar em torno do cotidiano dos paulistanos. Esse é o único ponto obrigatório de “Diálogos Urbanos”.
Desde já confesso estar sentindo um friozinho na barriga. Esse desconforto ainda não é capaz de tirar meu sono à noite, mas já provoca uma sensação de incomodo. Conseguirei apresentar uma coletânea de qualidade para os leitores do Blog Bonas Histórias? Confira a nova série narrativa da coluna Contos & Crônicas ao longo de 2019 e responda você mesmo à questão que tanto me intriga nas últimas semanas. Bom trabalho para todos nós!
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