O quinto livro de Patricia Highsmith que vamos analisar neste mês no Desafio Literário é “O Álibi Perfeito” (Biblioteca Visão). Encontrei esta obra na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo, em uma edição antiga produzida por uma editora portuguesa. Desconheço o lançamento deste livro por uma editora brasileira. Também acho difícil encontrar este título à venda em nosso país. Se você tiver muita sorte, pode achá-lo em um sebo. A procura mais certa parece ser em uma boa biblioteca. É esta a obra de Patrícia Highsmith que discutiremos hoje no Blog Bonas Histórias.
“Álibi Perfeito” integra a Coleção Lipton da Biblioteca Visão, a tal editora portuguesa responsável pela sua publicação. Essa série reúne 20 histórias policiais clássicas da literatura europeia e norte-americana. Fazem parte dos títulos selecionados pela Lipton: “As Aventuras de Sherlock Holmes”, de Arthur Conan Doyle, “Um Crime no Expresso do Oriente”, de Agatha Christie, “A Dama do Lago”, de Raymond Chandler, “Cara ou Coroa”, de Ellery Queen, “Cidade Escaldante”, de Chester Himes, entre outras obras canônicas desse gênero ficcional. Para quem gosta de uma boa narrativa policial, a antiga coleção da Biblioteca Visão é imperdível.
“O Álibi Perfeito” é uma coletânea de cinco contos policiais de Patricia Highsmith. Vale lembrar que a autora norte-americana ficou internacionalmente conhecida pelos seus romances criminais. Contudo, ela também escreveu narrativas curtas. Sua entrada na literatura ficcional, na década de 1940, aconteceu justamente com a publicação de contos policiais em revistas especializadas. A partir de 1970, a escritora voltaria a publicar suas pequenas histórias, dessa vez em coletâneas de contos. Ao todo foram oito livros desse tipo. No final da vida de Patricia e após a morte da autora, alguns de seus contos antigos foram selecionados e reunidos por editores independentes, o que deu origem a novas obras. É o caso de “O Álibi Perfeito”, minha leitura no último final de semana.
Publicado pela primeira vez em 1993, na Suíça, “O Álibi Perfeito” reúne histórias escritas por Highsmith em diferentes fases de sua carreira. Em comum, essas cinco tramas têm assassinatos ocorridos em Nova York, dão a impressão que são homicídios perfeitos e possuem reviravoltas impressionantes no último parágrafo, além do fato de terem narrativas de tamanho reduzido. Em média, cada um destes contos possui entre 15 e 20 páginas. Ah, outra coincidência entre eles é que todos são excelentes! Adorei esta obra. Patricia Highsmith não é apenas uma romancista talentosa como é também uma contista exímia.
Os contos desta coletânea são: “O Álibi Perfeito”, que empresta seu título ao nome do livro, “Não Se Pode Confiar em Ninguém”, “Variações de um Jogo”, “Uma Segurança Assente em Números” e “Maquinações”.
No conto “O Álibi Perfeito”, Howard Quinn mata George Frizell em uma estação de metrô lotada de Nova York. O assassino consegue fugir sem ser identificado. Ele acha que a polícia jamais suspeitará dele. Howard é noivo de Mary Purvis e trabalha como vendedor. Depois que o pai de Mary faleceu há alguns anos, a moça passou a ser tutelada pelo melhor amigo do pai, o tal George. George é contra o relacionamento de Mary e Howard. Por isso, o plano para matá-lo. Contrariando as expectativas do criminoso, a polícia nova-iorquina rapidamente localiza Howard. Os apuros do vendedor parecem terminados quando o acaso entra em ação. Parece que viram o carro de Howard em outro local da cidade na hora do crime. Será que ele se safará dessa?
“Não Se Pode Confiar em Ninguém” narra o assassinato de Lola Parson por seu ex-marido, Claude Merrivale, um ator em decadência que vive uma grave crise financeira. Lola, que já fora uma linda atriz no passado, trocou há alguns meses Claude por Ralf Carpenter, um jovem ator em início de carreira. Entretanto, Lola ainda não mudou seu testamento. O herdeiro de sua pequena fortuna continua sendo Claude. Dessa maneira, o ex-marido mata a antiga companheira e, ainda por cima, faz tudo de um jeito que a culpa do crime recaía em Ralf. Ele acredita que não haverá erro: assim que descobrirem que Lola morreu, ele colocará a mão na grana. O problema é que os dias passam e ninguém parece sentir falta de Lola. A atriz jaz sem vida no apartamento dela e ninguém, além do assassino, dão por sua ausência. Claude entra em desespero com a espera interminável pela confirmação do crime pela polícia.
Em “Variações de um Jogo”, o terceiro conto da coletânea, Penn Knowlton é o jovem assistente de David Ostrander, um escritor de ficção científica. Penn também é amante da esposa do patrão, a bela e jovial Ginnie. Os amantes querem viver juntos, mas Ginnie diz que seu marido jamais aceitará o divórcio. Incomodado por manter um relacionamento extraconjugal, o assistente do escritor decide abandonar o emprego. Não quer encontrar diariamente David nem Ginnie. Após anunciar ao casal sua decisão de partir, Penn se vê acusado de um crime. David sumiu misteriosamente e a última pessoa que o viu foi seu assistente. Para a polícia, parece óbvio que Penn é o assassino do marido de sua amante. O rapaz alega inocência e desconfia de Ginnie.
“Uma Segurança Assente em Números” é a trama em que três irmãos, Laura, Mary e Joel, decidem matar o próprio pai, Gordon Sommersby. Gordon é visto pelos filhos como um velho avarento e insensível. Milionário antes dos quarenta anos, o pai do trio jamais proporcionou uma vida confortável para a falecida esposa e para os filhos. O plano de Laura, Mary e Joel é simples. Eles vão empurrar Gordon da escada de um jeito que pareça que o velho tropeçou sozinho.
A última narrativa da obra é “Maquinações”. Esta é também a história mais engraçada do livro. Olivia Amory mata seu marido, Loren Amory, um profissional da Bolsa de Valores. Ela queria tirar Loren do seu caminho para poder viver com seu amante, o jovem ator Stephen Castle. Como a morte de Loren pareceu um acidente doméstico, Olivia não foi criminalizada. Uma vez viúva, a assassina rapidamente se casa com Stephen. A vida idílica do novo casal logo se transforma em um inferno. Olivia e Stephen têm medo que o parceiro queira repetir a estratégia anterior: matar o companheiro em uma ocasião que pareça um acidente doméstico para ficar sozinho com a fortuna deixada por Loren. Assim, tanto a esposa quanto o marido passam a arquitetar planos para eliminar o inimigo (ou seria companheiro?). Ao mesmo tempo, cada um deles precisa evitar que o outro seja bem-sucedido em perpetuar o crime.
“O Álibi Perfeito” é um livro curtinho. Ele tem menos de 100 páginas. É possível lê-lo em uma batida só. Demorei menos de duas horas para concluir sua leitura no último sábado à tarde. Apesar de todas as histórias serem muito parecidas, gostei bastante desta coletânea de contos. Patricia Highsmith mostrou mais uma vez ser uma escritora inteligente, muito bem-humorada, sintética e perspicaz. As reviravoltas nas tramas são espetaculares. Diferentemente do que acontece na saga literária de Tom Ripley, aqui o assassino sempre acaba se dando mal.
Afinal de contas, por que as narrativas do livro são tão parecidas? Todos os cinco contos de “O Álibi Perfeito” são ambientados em Nova York, há sempre um triângulo amoroso em cada enredo, o assassinato mistura interesses financeiros e passionais e o crime parece perfeito até que um detalhezinho no último parágrafo muda toda a história. Repare também no humor dessas tramas. Mesmo diante de cenas bárbaras e de personagens insensíveis, é possível achar graça em muitas passagens. Nesse sentido, “Não Se Pode Confiar em Ninguém” e “Maquinações” são os melhores contos da obra. Não me recordo de ter lido nada com tanto humor negro nos últimos anos.
Apreciei tanto estas tramas que fiquei imaginando que elas poderiam muito bem ter dado origem a ótimos romances. Talvez, esse seja o melhor indicativo de uma boa coletânea de contos. Fiquei com vontade de ler outros livros de narrativas curtas de Patricia Highsmith. Porém, sei que não será dessa vez. Agora preciso ler “Small G” (Mandarim), o último romance publicado pela escritora norte-americana. Essa leitura fechará o Desafio Literário deste mês e sua análise será publicada no Bonas Histórias na próxima sexta-feira, dia 26. Quem sabe eu não deixe para ler mais contos de Highsmith no próximo ano, hein? Podem me cobrar.
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