O Carnaval é considerado historicamente a festa mais popular do país. Há quem diga que o ano no Brasil só comece efetivamente depois dele. Não há restrições nem preconceitos entre o Sábado carnavalesco e a Quarta-feira de Cinzas. As pessoas, independentemente da idade, do sexo, da classe social e da cor de pele, vão às ruas para brincar e se divertir. Acho esse hábito interessante e válido. Não me incomodo, como alguns mais conservadores, com os excessos alheios e com o comportamento fora do habitual de muita gente. Cada um faz o que acha melhor e arca depois com as consequências dos seus próprios atos. Nada mais natural e justo! Como todo período catártico e de descompressão psicológica, são normais alguns deslizes e abusos.
Acho muita graça quando as pessoas falam: “Não gosto do Carnaval. Nessa época do ano eu fujo da cidade e fico enfurnado no meu sítio”; “Este é o período do ano da luxúria e da sem-vergonhice”; e “Todo ano é a mesma coisa, pessoas peladas por todos os lados”.
O que me angustia, para ser sincero, é a falta de uma data em nosso calendário para as pessoas estimularem seus cérebros e suas mentes. Você já refletiu sobre isso? O Carnaval é a época do ano para as pessoas se soltarem e exibirem seus corpos sarados. O Natal é o período no qual os indivíduos trocam gentilezas e afetos. Nas eleições, o povo discute política e emite suas opiniões partidárias. Durante os grandes eventos esportivos é a hora de partilhar o patriotismo e de incentivar as práticas esportivas.
Nesse calendário repleto de atividades com as mais variadas finalidades, onde está o momento em que vamos nos esbaldar em reflexões e leituras? Qual é a época do ano em que vamos despir as páginas dos livros e vamos interagir com autores desconhecidos sem preconceito? Não há!
O problema não é o Carnaval estar propenso aos prazeres carnais. A verdadeira inquietação, pelo menos da minha parte, está em saber que não haverá nada parecido, ao longo do ano, em relação aos encantos intelectuais. Que povo é esse que não quer ou não gosta de se esbaldar mentalmente?! Por que não temos um Carnaval Cultural?!
Estou tão carente de bons e intensos momentos de cultura que estou seriamente pensando em criar uma festa pagã intelectual. Já imaginou isso? Cinco dias com distribuições de livros, mergulho em sessões de cinema, apresentações cênicas e musicais e visitações gratuitas em exposições visuais? Consigo, desde já, antever os debates acalorados na televisão, na internet e nos jornais sobre os vários aspectos artístico-culturais desse evento. Quem sabe o Zulu não apresente as notas dos quesitos com sua voz rouca: “Novo livro do Umberto Eco, categoria originalidade, nota DEZ!; ou “Novo filme do José Padilha, nota nove e meeeeeio.”. E a multidão, alojada nas arquibancadas, acompanhando avidamente a análise crítica dessas obras.
É claro que haverá quem recrimine esses dias: “Não gosto do Carnaval Cultural. Nessa época do ano eu fujo da cidade e fico enfurnado no meu sítio”; “Este é o período do ano da introspecção e da reflexão – uma chatice completa!”; e “Todo ano é a mesma coisa, intelectuais se exibindo por todos os lados”.
O único problema desse novo evento seria escolher a melhor data para a sua realização. Uma coisa eu sei: ela não seria entre fevereiro e março. Afinal, todos devemos e podemos aproveitar essa época para nos divertir também. O principal defeito do Carnaval tradicional, portanto, é a falta de uma extensão intelectual. O que fazer, afinal, quando os dias de folia acabarem?
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