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Bonas Histórias

O Bonas Histórias é o blog de literatura, cultura, arte e entretenimento criado por Ricardo Bonacorci em 2014. Com um conteúdo multicultural (literatura, cinema, música, dança, teatro, exposição, pintura e gastronomia), o Blog Bonas Histórias analisa as boas histórias contadas no Brasil e no mundo.

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Ricardo Bonacorci

Nascido na cidade de São Paulo, Ricardo Bonacorci tem 43 anos, mora em Buenos Aires e trabalha como publicitário, produtor de conteúdo, crítico literário e cultural, editor, escritor e pesquisador acadêmico. Ricardo é especialista em Administração de Empresas, pós-graduado em Gestão da Inovação, bacharel em Comunicação Social, licenciando em Letras-Português e pós-graduando em Formação de Escritores.  

Foto do escritorRicardo Bonacorci

Talk Show Literário: Evangelista


Talk Show Literário: Evangelista

[Quinteto musical termina de tocar a canção-tema do Talk Show Literário].

Darico Nobar: Olá, fãs da literatura brasileira. É com muita alegria que anuncio o início de mais um programa. Nesta noite, nosso convidado é o protagonista do Romance do Pavão Misterioso, uma das histórias de cordel mais famosas de nosso país. Com vocês: Evangelista!

Plateia: Uhu! Lindo! Gostoso! [O público feminino aplaude e grita ao ver o entrevistado entrar no auditório].

Evangelista: Obrigado, pessoal, pelo carinho. Boa noite, Darico.

Darico Nobar: Boa noite, meu amigo! Como é bom recebê-lo em nosso programa.

Evangelista: Gostaria de iniciar esta entrevista parabenizando você e sua equipe pela iniciativa de incluir um representante da literatura de cordel no Talk Show Literário. Apesar de ser uma manifestação artística extremamente rica, o cordel, infelizmente, ainda é alvo de muito preconceito no Brasil.

Darico Nobar: Você tem toda a razão, Evangelista. É uma pena, mas esse gênero tem sofrido com o paulatino esquecimento dos leitores e do mercado editorial. Por quê?

Evangelista: Acho que é porque o cordel se desenvolveu principalmente no Nordeste brasileiro. Quando esse tipo de literatura veio de Portugal para cá, ele entrou com mais força em Pernambuco e nos estados vizinhos. Assim, muita gente ainda hoje vê o cordel como uma literatura exclusivamente nordestina. Ninguém se preocupa em verificar o quanto ele é praticado em outros lugares, inclusive no exterior, e o quanto é uma manifestação artística plural. Por isso, não acho que haja esquecimento e sim preconceito. Como tudo aquilo que não vem do eixo Rio-São Paulo, o cordel é muito estigmatizado.

Darico Nobar: O fato de essa literatura ter um aspecto mais popular e de se utilizar da linguagem oral ajuda na sua discriminação?

Evangelista: Evidente! A elite brasileira e os influenciadores culturais de nosso país têm grande ojeriza por tudo o que é popular. Eles imaginam que algo que tenha vindo diretamente das massas só pode ser feio, ruim e pobre intelectualmente. Vê se pode!

Darico Nobar: O oposto do que é o cordel em sua essência... Sou suspeito para falar sobre isso, pois sou um grande fã desse gênero.

Evangelista: Exatamente, Darico. A beleza do cordel está em suas rimas, em suas métricas, no conteúdo emocionante de suas tramas e nas xilogravuras. Seu texto é para ser lido e, principalmente, cantado. Juro que não consigo ler a literatura de cordel em voz baixa. Sua prosa poética precisa ser recitada a plenos pulmões.

Darico Nobar: Romance do Pavão Misterioso é uma história passada parte na Turquia e parte na Grécia. São comuns as tramas ocorrerem no exterior?

Evangelista: Sim. Nesse ponto, o cordel é parecido com as telenovelas da Rede Globo. Alguns sucessos brasileiros são ambientados lá fora. Há, sim, uma parte do cordel que se passa no meio rural nordestino. O cangaço, as figuras típicas do folclore nordestino, como Gonzaga, Padre Cícero e Patativa do Assaré, e os problemas sociais e ambientais da região, como a seca e a miséria do Sertão, são temas recorrentes. Por outro lado, há enredos medievais, contos de fadas, guerras históricas e criações fantásticas que se passam fora do Brasil. Essa é outra prova da riqueza literária desse gênero. Sua temática é muito variada.

Darico Nobar: Ser uma personagem da literatura de cordel e, ainda por cima, ser estrangeiro aumenta o preconceito contra você aqui no Brasil?

Evangelista: Talvez... Porém, não me preocupo com isso. Minha sorte é que sou um capitalista bem-sucedido. Como sou rico, graças às heranças deixadas pelo meu pai e pelo meu sogro, tenho uma ótima qualidade de vida. Assim, não sofro tanto preconceito. O principal preconceito que as pessoas sofrem no Brasil é de ordem financeiro/social. Se você é rico, você será benquisto em qualquer lugar. Se for pobre, aí sim a coisa complica para o seu lado...

Darico Nobar: Evangelista, afinal de contas, quem foi o autor do Romance do Pavão Misterioso: João Melquíades Ferreira da Silva ou José Camelo de Melo?

Evangelista: Sabe que todo mundo me faz essa pergunta... Até hoje tenho minhas dúvidas. [O entrevistado ri como se quisesse esconder a resposta].

Darico Nobar: Ah! Não vá ficar em cima do muro, por favor! Como personagem literária, você deve saber quem foi seu verdadeiro criador. Talvez, você seja o único que possa solucionar essa polêmica que já se arrasta por quase cem anos.

Evangelista: Tenho um carinho especial pelos dois artistas. Tanto João Melquíades quanto José Camelo foram importantíssimos para o Romance do Pavão Misterioso e, de maneira geral, para o cordel brasileiro. Sem eles, eu não teria nascido nem me desenvolvido. É verdade que um foi o responsável pela minha construção como personagem e o outro deu uma melhorada na história. Ou seja, um inventou e o outro aperfeiçoou. Por isso, considero os dois como sendo meus criadores, tendo ambos os méritos autorais pela história. Sem um deles, eu não teria me tornado tão popular dentro do universo literário.

Darico Nobar: Não conhecia esse seu lado tão diplomático, Evangelista. [O apresentador ri]. Falou, falou, falou e não respondeu a minha questão.

Evangelista: Na Turquia, temos um provérbio que diz: "Quem te fala mal de outras pessoas, falará mal de ti também". Gosto de seguir sempre esse raciocínio.

Darico Nobar: Entendo a sua posição. Escolher um dos lados nessa eterna discussão representaria a cisão automática com o outro autor. Prometo não perguntar mais nada sobre esse tema, está bem? Quero saber agora tudo sobre sua história com Creusa. Você não acha loucura ter partido da Turquia para a Grécia para conquistar o coração de uma moça que você viu em uma fotografia?

Evangelista: E o que seria da gente se não fossem as loucuras pregadas pelos nossos corações, hein?! [O público no auditório aplaude as palavras do entrevistado]. Assim que vi aquela foto, percebi que a Creusa era a mulher da minha vida.

Plateia: Ohhhhhhhh!

Evangelista: Com essa crença, não achei errado pegar a parte da fortuna que meu pai me deixou e seguir para outro país para conquistar a Creusa a qualquer preço.

Darico Nobar: Então você sabia desde o início que ela seria a mulher da sua vida?

Evangelista: Claro. Existem amores para serem vividos de longe e outros para serem vividos de perto. A minha paixão por Creusa era do segundo tipo. Soube distingui-lo perfeitamente no exato instante em que meus olhos viram o retrato dela.

Darico Nobar: Uma história de amor tão bonita e improvável é a principal explicação para o sucesso desse cordel?

Evangelista: Há quem diga que sua graça esteja no humor da trama e nas invencionices do meu amigo Edmundo. Por falar nele: um abraço para você, Edmundo, se você estiver assistindo ao Talk Show Literário aí em Atenas.

Darico Nobar: O lance de você ficar entrando e saindo do quarto da condessa com o aeroplano dá realmente um charme ao enredo. O aeroplano seria uma antecipação do helicóptero ou seria mais um drone tripulado?

Evangelista: Prefiro pensá-lo como um pavão misterioso. Essa explicação é satisfatória tanto para mim quanto para a Creusa. E foi também como o Edmundo, esse animaaaaaaaaaaaal da Engenharia, chamou seu invento.

Darico Nobar: Você acha que os irmãos Grimm ficariam frustrados se soubessem a solução que vocês encontraram para tirar a condessa do alto da torre?

Evangelista: Não sei! [O entrevistado e o apresentador riem bastante]. A diferença é que a Rapunzel tinha aquelas longas tranças douradas e minha Creusa não. Portanto, não dava para me agarrar aos poucos cabelos da minha amada. Talvez a solução encontrada pelos irmãos Grimm, se pensarmos bem, seja menos tecnológica e muito mais criativa do que a do Edmundo. Só não pode a princesa deles ter pontas duplas ou fios enfraquecidos. Aí, fica perigoso demais para o escalador de janelas!

Darico Nobar: Evangelista, como está sua vida de casado hoje em dia?

Evangelista: Eu e a Creusa continuamos tão apaixonados como no primeiro dia em que nos conhecemos.

Plateia: Ohhhhhh! [Alguém no fundo do auditório solta o grito de “Lindo”].

Evangelista: Nossa vida de casado daria um romance idílico. Devo agradecer muito ao meu sogro, o conde de Atenas.

Darico Nobar: Por quê?

Evangelista: Quando um pai tranca sua filha por dezoito anos em uma torre e não a deixa ter contato com ninguém, qualquer vida diferente dessa é uma maravilha. Definitivamente, Creusa não tem o que reclamar de mim e do nosso casamento.

Darico Nobar: E você, tem motivos para lamentações e arrependimentos?

Evangelista: Também não tenho o que lastimar. Uma mulher linda como ela é o sonho de qualquer homem. Além do mais, não precisei gastar uma fortuna para conquistá-la como havia imaginado. Assim que nos casamos, recebi a herança do pai dela para administrar. Tem coisa melhor do que essa combinação: esposa jovem e bonita e herança milionária do sogrão?!

Plateia: Ahhhhhh! [Uma voz conhecida berra agora “Desgraçado”].

Darico Nobar: A Creusa não se sentiu culpada pela morte do pai?

Evangelista: Fique você trancado em uma torre por quase duas décadas e saberá o motivo dela não ter derramado uma só lágrima no dia do enterro do pai.

Darico Nobar: Evangelista, muito obrigado pela sua visita. Esta temporada do Talk Show Literário não estaria completa se você não tivesse vindo conversar conosco.

Evangelista: Eu que agradeço o convite. É sempre um prazer viajar ao Brasil para falar com vocês, um povo bonito e inteligente.

Plateia: Uhu! Lindo! Gostoso! [O público volta a aplaudir, gritar e se derreter pelo convidado].

Darico Nobar: Essa mulherada não pode ver homem rico que perde as estribeiras... Meninas, ele é casado! [O público feminino no auditório continua enlouquecido. Algumas pessoas invadem o palco para agarrar o entrevistado]. Evangelista, fique calmo porque temos seguranças treinados para conter a plateia. Seguranças!!! Pessoal de casa, até semana que vem. Abração e boa noite a todos!

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O Talk Show Literário é o programa de televisão fictício que entrevista as mais famosas personagens da literatura. Assim como ocorreu nas duas primeiras temporadas, neste terceiro ano da atração, os convidados de Darico Nobar, personagem criada por Ricardo Bonacorci, são os protagonistas dos clássicos brasileiros. Para acompanhar as demais entrevistas, clique em Talk Show Literário. Este é um quadro exclusivo do Blog Bonas Histórias.

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