Woody Allen é um dos meus diretores de cinema preferidos. Não perco nenhum dos seus lançamentos desde que fiquei deslumbrado com "Vicky Cristina Barcelona" (2008). Também sou daqueles fãs que mergulham nos clássicos do diretor. Das décadas de 1970 e 1980, meus preferidos são "Noivo Neurótico, Noiva Nervosa" (Annie Hall: 1977), "Manhattan" (1979) e "Hannah e Suas Irmãs" (Hannah and Her Sisters: 1986). Por isso, sentia-me um pouco mal comigo mesmo por nunca ter conseguido assistir a "Ponto Final - Match Point" (Match Point: 2005). Consegui, depois de tantos encontros e desencontros, desfazer esta mancha em minha história cinéfila, conferindo esta produção neste final de semana.
"Ponto Final - Match Point" representou uma guinada na carreira de Woody Allen. Depois de gravar por muitos anos apenas em Nova York (sendo visto como um cineasta melancólico da Big Apple), o diretor enfim partiu para o mundo. Este longa-metragem de 2005, por exemplo, foi gravado inteiramente em Londres. Depois desta experiência bem-sucedida, o norte-americano passou a filmar na Espanha, na França e na Itália, tornando suas tramas mais internacionais. Há quem sempre solte o boato que sua próxima investida será no Rio de Janeiro.
Respirar novos ares fez muitíssimo bem para o diretor. Não é à toa que a última década significou, pelo menos na minha visão, o período mais criativo de Allen. Nesta fase mais recente, Woody Allen conseguiu aliar seu humor peculiar com a dramatização de histórias complexas e de assuntos polêmicos. Praticamente vemos na tela versões bem-humoradas de tramas que poderiam muito bem descambar para o dramalhão. Isso só não acontece com o diretor nova-iorquino pelo seu talento cômico singular. Praticamente rimos e nos divertimos, sem culpa, com as situações mais polêmicas e delicadas.
"Ponto Final - Match Point" também marcou o início da parceria do diretor com a atriz Scarlett Johansson. Ela seria sua protagonista em "Scoop - O Grande Furo" (Scoop: 2006) e "Vicky Cristina Barcelona" (2008). Como é bom ver Johansson em papéis em que pode explorar seu talento artístico, além da exibir sua beleza descomunal.
O enredo de "Ponto Final - Match Point" gira em torno do ex-jogador de tênis Chris Wilton (interpretado por Jonathan Rhys-Meyers). Cansado da vida de viagens e da pressão pelas vitórias do circuito profissional, ele decide se mudar para Londres. Na capital inglesa, o rapaz passa a trabalhar como professor de tênis em um seleto clube da cidade. Um dos seus alunos, Tom Hewett (Matthew Goode), é filho de um rico empresário local. O convívio dos dois se transforma em amizade e, assim, Chris rapidamente se torna amigo da rica família do aluno.
Convivendo com os Hewett, Chris Wilton inicia um namoro com Chloe (Emily Mortimer), irmã de Tom. O relacionamento traz muitas vantagens para o rapaz. Ele ganha um emprego melhor (de executivo em uma das empresas do sogro), passa a frequentar lugares caros e é mimado constantemente pelos pais de Chloe (Brian Cox e Penelope Wilton), que desejam o casamento da filha com o ex-jogador de tênis. De repente, dinheiro não é mais um problema na vida de Chris.
Contudo, o protagonista da trama fica dividido. Chris Wilton acaba se apaixonando por Nola Rice (Scarlett Johansson), a estonteante namorada de Tom. Desequilibrada emocionalmente e com uma carreira de atriz fracassada, a bela moça é totalmente dependente do namorado milionário. Assim, tanto Chris quanto Nola são as peças frágeis daquela engrenagem social. Um relacionamento entre eles pode significar o fim de uma vida confortável e tranquila para ambos. O que Chris deve fazer? Deve abandonar o luxo e a segurança de um casamento com Chloe ou deve investir em um namoro arriscado e sem futuro com Nola, a mulher que ele verdadeiramente ama?
O grande tema deste filme de Woody Allen é, obviamente, a dicotomia entre o amor genuíno e o interesse financeiro. A dramaticidade é potencializada à medida que as decisões são tomadas pela personagem de Jonathan Rhys-Meyers. Suas condutas jogam todos os envolvidos em uma sinuca de bico. As incertezas e as preocupações de Chris Wilton o levam a adiar ao máximo a decisão final sobre tão complexa questão.
Um dos pontos que mais gostei do longa-metragem é o das citações literárias. Durante todo o filme, os personagens fazem referências, explícita ou implicitamente, aos clássicos da literatura, pontuando com classe os debates filosóficos em que estão sujeitos. O caso mais óbvio é o do romance "Crime e Castigo" de Dostoievski. Os conflitos e, principalmente, os comportamentos de Chris Wilton se parecem muito com os de Rodion Românovitch Raskólnikov. A referência ao grande sucesso de Dostoievski fez o diretor Woody Allen dizer que "Ponto Final - Match Point" é sua versão cinematográfica de "Crime e Castigo".
Gostei muito deste filme. Com mais de duas horas de trama, este é o longa-metragem mais longo da carreira do diretor norte-americano até aqui. A fotografia é ótima, os atores estão esplendidos em suas atuações (Scarlett, casa comigo!) e a tensão vai aumentando aos poucos até desembocar em um final angustiante. O ponto alto, como sempre acontece nas produções de Woody Allen, está em seu roteiro maravilhoso. Não por acaso, ele concorreu ao Oscar de 2006 na categoria de Melhor Roteiro Adaptado.
Apesar da excelência do filme, senti um pouco de falta do humor irônico e do clima leve e descontraído que o diretor tem apimentado suas últimas produções. Entretanto, a falta destes elementos é perfeitamente aceitável aqui. Se ele exagerasse na leveza, no humor e na sutileza, não conseguiria recriar o clima tenso e angustiante de "Crime e Castigo". Afinal de contas, estamos falando de um longa-metragem que tem a cara de Dostoievski!
Veja o trailer de "Ponto Final - Match Point":
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